*Por Theo Peixoto Scudellari e Victor Tozetto da Veiga.
Neste e nos próximos meses, o Observatório da Corte Internacional de Justiça (CIJ) do Cosmopolita publicará uma série de textos voltada à jurisprudência da CIJ sobre a proibição do uso da força. Até o final do ano, publicaremos resumos e análises dos principais casos da história da Corte envolvendo esse tópico. E, para dar início à série, este é o primeiro de dois textos introdutórios com objetivo de apresentar, de forma resumida, o panorama atual da regulação jurídica do uso da força nas relações internacionais.
Neste texto, apresentaremos conceitos básicos sobre o uso da força, sua proibição no sistema internacional e as exceções a essa proibição (legítima defesa, autorização do Conselho de Segurança e consentimento). Abordaremos também alguns dos conceitos e requisitos centrais para a legítima defesa (ataque armado, necessidade e proporcionalidade, legítima defesa coletiva e notificação do Conselho de Segurança). No texto seguinte, apresentaremos alguns dos principais debates atuais acerca do uso da força (legítima defesa antecipada/preemptiva, legítima defesa contra grupos não estatais, intervenção humanitária e responsabilidade de proteger) e trataremos brevemente da prática do Conselho de Segurança ao autorizar o uso da força.
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A PROIBIÇÃO DO USO DA FORÇA DURANTE O SÉCULO XX
Até a primeira metade do século XX, entendia-se que os Estados podiam livremente (ou com poucas limitações) recorrer à guerra para fazer valer seus direitos. A Primeira Guerra Mundial, no entanto, representou um grande abalo para as relações internacionais e as formas pelas quais os Estados conduziam suas políticas. Novas abordagens sobre o tema da guerra passaram a ganhar espaço nos debates e agendas internacionais e a incentivar a busca pela harmonia, cooperação e paz entre os Estados. Assim, diversos esforços foram empreendidos para a busca desses objetivos, resultando em alguns arranjos, como o pacto da Liga das Nações (1919), que estabelecia condições procedimentais antes que os Estados pudessem recorrer à guerra e a proibia em certas circunstâncias, e o Pacto Kellog-Briand (1928), que condenava o uso da força como instrumento de condução da política externa.
Entretanto, a década de 1930 ficou marcada pela instabilidade e pelas ameaças militares, o que levou à falha desses projetos e ao eclodir da Segunda Guerra Mundial em 1939. Durante e após o conflito, compreendeu-se que havia necessidade de rearranjos no debate internacional sobre o uso da força, o recurso à guerra e os princípios do direito internacional em prol da busca pela paz. A criação da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945, é o marco fundamental para a busca desses objetivos.
A Carta da ONU, assim, é a pedra angular da atual proibição do uso da força – que, por sua vez, é um dos princípios fundamentais das relações internacionais contemporâneas. No preâmbulo da Carta, está estabelecido que “a força armada não será usada a não ser no interesse comum” e, no artigo 2(3), que “todos os membros resolverão suas controvérsias internacionais por meios pacíficos”. A proibição do uso da força, entendida como ação armada entre Estados, encontra sua expressão mais clara no artigo 2(4) da Carta:
(4) Todos os membros devem se abster, nas suas relações internacionais, da ameaça e do uso da força contra a integridade territorial ou independência política de qualquer Estado, ou de qualquer outro modo incompatível com os propósitos das Nações Unidas (tradução nossa).
Observa-se que não só a ação direta pautada pela força é considerada como ilegal, mas também a própria ameaça do uso da força. A CIJ, em sua Opinião Consultiva sobre a Legalidade da Ameaça ou Uso de Armas Nucleares (1996) menciona que esses conceitos devem ser interpretados em conjunto: se um determinado uso da força seria proibido conforme o artigo 2(4), qualquer ameaça desse uso será também ilegal (par. 47).
De uma perspectiva jurídica, dois aspectos em relação ao status da proibição do uso da força no direito internacional contemporâneo merecem destaque. Primeiramente, essa norma é majoritariamente vista como uma norma peremptória de direito internacional (jus cogens) – isto é, uma norma que reflete os valores essenciais da comunidade internacional, que não pode ser derrogada senão por outra norma posterior de mesma natureza e cujo descumprimento faz surgir obrigações particulares (como a de não reconhecer a legalidade das consequências da violação). Em segundo lugar, conforme definido pela CIJ no caso das Atividades Militares na e contra a Nicarágua (Nicarágua vs. Estados Unidos, 1986), a Carta da ONU não esgota a regulação internacional sobre o tema, pois o uso da força também é limitado pelo direito internacional costumeiro, que corre em paralelo ao direito da Carta e pode ser usado para interpretá-la (par. 172-182).
De uma perspectiva das relações internacionais, cabe reconhecer que, por serem questões complexas envolvendo sujeitos soberanos sem uma autoridade político-jurídica superior, os temas relacionados à guerra sempre foram palco de controvérsias e divergências. E, mesmo após a criação da ONU, a situação não é muito diferente: existem ainda grandes debates jurídicos e políticos sobre a aplicação dos princípios estabelecidos na Carta. Mas o que não se pode perder de vista é que, independentemente desses debates, a proibição do uso da força disposta na Carta é um guia cogente e de fundamental importância para o direito e as relações internacionais.
EXCEÇÕES À PROIBIÇÃO DO USO DA FORÇA
A fundamentalidade da proibição do uso da força não impede o reconhecimento de situações nas quais o recurso a ações armadas é excepcionalmente permitido. A Carta da ONU reconhece duas dessas exceções de modo expresso: o direito à legítima defesa (previsto no artigo 51) e a possibilidade de que o Conselho de Segurança autorize ações armadas para manter ou restaurar a paz e a segurança internacionais (prerrogativa regulada pelo Capítulo VII da Carta e, mais especificamente, pelo artigo 42).[1] Além disso, surge do direito internacional geral a possibilidade de que Estados consintam ao uso da força em seus territórios por outros Estados. Outras possíveis exceções são controversas e, por esse motivo, serão abordadas pelo segundo texto da série ao tratar dos debates contemporâneos.
Legítima defesa
Como referido, o direito à legítima defesa é reconhecido expressamente pelo artigo 51 da Carta da ONU. Na prática, é a principal exceção à proibição do uso da força, já que se trata do argumento mais frequentemente invocado pelos Estados para justificar ações militares. Inclusive, todos os casos da CIJ substancialmente relacionados ao uso da força envolveram, com maior ou menor detalhamento, análises sobre o direito à legítima defesa.
A legítima defesa autoriza que os Estados lancem mão de ações armadas para responder a uma violação prévia à proibição do uso da força, isto é, a uma agressão de caráter armado. De forma mais direta, a ação em legítima defesa é um uso legal da força justamente porque tem como objetivo repelir um uso prévio e ilegal da força por parte de outro Estado. A lógica é semelhante ao direito à legítima defesa que as ordens jurídicas nacionais garantem aos indivíduos. Tendo relação com a própria sobrevivência dos Estados, funciona como um elemento a ser evocado quando o Estado, sua integridade e os sujeitos que o compõem estejam ameaçados.
Ao reconhecer o direito “inerente” dos Estados à legítima defesa, a Carta da ONU deixou claro que não criou um novo direito. Em realidade, como declarou a CIJ no caso Nicarágua, a Carta meramente reconheceu um direito que já existia previamente sob a guarda de normas costumeiras (par. 176), associado à soberania dos Estados e à necessidade de preservá-la. Ademais, ao longo de sua história jurisprudencial, a CIJ realizou importantes esclarecimentos acerca do conteúdo postulado no artigo 51 da Carta das Nações Unidas, atestando a legítima defesa como um direito fundamental dos Estados. Crucialmente, a permissibilidade da legítima defesa deve sempre ser interpretada de forma conjunta com o artigo 2(4) da Carta, contribuindo para a construção de uma perspectiva analítica e interpretativa restritiva voltada a garantir a proibição do uso da força.
A princípio, em uma situação conflituosa envolvendo a legítima defesa, a ação de apenas um dos lados está albergada pela legalidade. Ou seja, um dos envolvidos (aquele que realizou o primeiro ataque armado) é um transgressor das normas do direito internacional. Há casos, inclusive, em que dois Estados invocam simultaneamente o direito à legítima defesa, como nos ataques recíprocos entre Irã e Estados Unidos em janeiro deste ano ou no atual confronto envolvendo Armênia e Azerbaijão em torno da província de Nagorno-Karabakh (ou República de Artsakh), que, embora não seja um Estado reconhecido internacionalmente, também alega legítima defesa em nome próprio. Nessas situações, a alegação de um (ou alguns) dos Estados é provavelmente errônea.
Foto: Hrant Khachatryan/AP Photo/PanARMENIAN
Nada impede, no entanto, que o Estado inicialmente transgressor seja subsequentemente vítima de um uso abusivo do direito à legítima defesa por parte do Estado atacado. Isso acontecerá toda vez que o Estado exercendo a legítima defesa descumpra com os requisitos impostos a este exercício pelo direito internacional, como a necessidade e a proporcionalidade (abordadas abaixo). Neste caso, o Estado inicialmente atacado violará também a proibição do uso da força, e ambos, por motivos distintos, serão simultaneamente vítimas e transgressores.
Apesar da relevância do direito à legítima defesa, não se pode determinar que será sempre um direito caracterizante do sistema internacional ou que terá sempre os mesmos contornos, principalmente tendo em vista a volatilidade de alguns termos desse campo de debate, conforme buscará demonstrar o segundo texto da série. O que é hoje determinante para as relações conflituosas e as relações internacionais em geral pode não permanecer da mesma forma no futuro. Mesmo assim, a legítima defesa é hoje um elemento essencial, de natureza costumeira reconhecida e que norteia muitas ações nas relações internacionais.
Autorização do Conselho de Segurança
Outra exceção à proibição do uso da força é a possibilidade de que o Conselho de Segurança autorize ações armadas para manter ou restaurar a paz e a segurança internacionais. De acordo com a estrutura das Nações Unidas, que concretiza o que se conhece como “segurança coletiva”, o Conselho de Segurança é o órgão primariamente responsável pelas ações voltadas para a efetivação da paz e da segurança internacionais. Em virtude do Capítulo VII da Carta, o Conselho de Segurança tem a competência para declarar a existência de “qualquer ameaça à paz, quebra da paz, ou ato de agressão” e determinar medidas vinculantes a todos os Estados para enfrentar estas situações.
Sendo assim, como disposto no Artigo 41 da Carta, o Conselho pode buscar soluções não militares – como bloqueios econômicos, marítimos e afins – para manter ou restaurar a paz e a segurança internacionais. Contudo, na ausência de possibilidade de efetivar esse tipo de ação – ou até mesmo se a necessidade for além dessa –, o Conselho de Segurança pode autorizar o emprego de força militar. Em outras palavras, esta prerrogativa, prevista no já citado artigo 42 da Carta, assegura ao Conselho de Segurança a capacidade de atribuir legalidade ao uso da força para velar pela paz e a segurança internacionais. O exercício dessa prerrogativa será analisado, ainda que brevemente, no segundo texto da série.
Consentimento
Uma terceira exceção – decorrente, desta vez, não da Carta da ONU, mas do direito internacional geral – refere-se à ideia de consentimento. Esse conceito se refere a uma modalidade de uso da força em que o Estado que “recebe” a ação dá seu aval para que força estrangeira seja utilizada em seu território, principalmente para fazer face a questões domésticas, como guerras civis, grupos insurgentes e a presença de terroristas. É essa figura que explica a presença militar atual da Rússia em território Sírio e dos Estados Unidos no Afeganistão e no Iraque (que não deve ser confundida com as justificativas para o uso da força respectivamente em 2001 e 2003).
A permissibilidade do uso da força em caso de consentimento segue a lógica do artigo 20 dos Artigos sobre Responsabilidade Internacional de Estados por Atos Internacionalmente Ilícitos (em inglês aqui), elaborados pela Comissão de Direito Internacional da ONU: o consentimento opera como excludente de ilicitude de condutas que, de outro modo, seriam ilícitas (desde que tais condutas não ultrapassem os limites do consentimento oferecido). Mas essa possível exceção à proibição do uso da força não deixa de ter seus desafios. Em situações de conflito interno, a situação precária do governo (inefetividade ou ilegitimidade) pode afetar a capacidade jurídica de consentir em nome do Estado. Além disso, a assistência militar estrangeira pode se tornar ilegal em caso de choque com o direito à autodeterminação de um povo. E o que temos visto, na realidade, é que intervenções por “convite” representam grande risco à proteção dos direitos humanos.
CONCEITOS CENTRAIS DA LEGÍTIMA DEFESA
Ataque armado
Como é possível observar a partir do artigo 51 da Carta da ONU, a legítima defesa só é possível em resposta a um “ataque armado” (armed attack, na versão em inglês da Carta), ou seja, de uma agressão armada (agression armée, na versão em francês) que viola não só o princípio fundamental das relações internacionais da não-intervenção, mas também os aspectos mais centrais da proibição do uso da força.
Nos casos Nicarágua (já referido), Plataformas Petrolíferas (Irã vs. Estados Unidos, 2003) e Atividades Armadas no Território do Congo (República Democrática do Congo vs. Uganda, 2005), a CIJ aplicou uma matriz para classificar os atos de Estados nesse campo. Segundo a Corte, nem todos os atos que violam o princípio da não-intervenção (por exemplo, o mero financiamento de grupos armados em outro Estado) violam a proibição do uso da força (que é transgredida, por exemplo, quando um Estado financia, arma e treina grupos armados ou tem “controle efetivo” sobre eles). Do mesmo modo, nem todos os atos que constituem um uso ilegal da força atingem o nível de um ataque armado. Conforme a famosa declaração no caso Nicarágua, somente as “formas mais graves do uso da força” podem ser consideradas um ataque armado (par. 191) e, consequentemente, permitir ação em legítima defesa. O conceito de ataque armado foi crucial no caso das Plataformas Petrolíferas: a Corte considerou que os ataques realizados pelos Estados Unidos contra plataformas iranianas foram ilegais porque os atos anteriores do Irã não haviam configurado ataques armados (par. 46-72).
Foto: Frank Van Beek/ICJ/UN News
Em sua Opinião Consultiva sobre armas nucleares (já referida), a CIJ também compreendeu que não há uma especificidade sobre o tipo ou modelo de arma empregada. Seguindo esta lógica, além de armas de fogo, também armas cibernéticas ou biológicas, por exemplo, podem potencialmente ser utilizadas para realizar um ataque armado.
O texto da Carta da ONU e a jurisprudência da CIJ, no entanto, não permitem concluir imediatamente se a legítima defesa pode ser praticada em antecipação a um ataque iminente ou se, ao contrário, um ataque armado deve ocorrer materialmente antes que um Estado possa se defender. Como esse tópico é altamente controverso, será abordado ao lado de outros debates no segundo texto da série.
Necessidade e Proporcionalidade
Mesmo em face de um ataque armado, a resposta de um Estado deve respeitar limites, que devem ser levados em conta antes da ação tomada em legítima defesa e durante sua execução. Os principais requisitos que devem ser cumpridos pela legítima defesa nesse sentido são a necessidade e a proporcionalidade. Apoiando-se no precedente do caso Nicarágua, a Corte declarou em sua Opinião Consultiva sobre armas nucleares que esses requisitos são parte do direito internacional costumeiro, e a jurisprudência posterior da Corte (notadamente no já referido caso Plataformas Petrolíferas) confirmou a importância desses limites e delineou melhor seus conteúdos.
Em breves termos, a necessidade refere-se à falta de outras possibilidades na busca pela resolução das hostilidades. Se não há mais recursos pacíficos para a solução das conflitualidades e se não há outras opções menos severas para repelir um ataque, uma ação armada fundamentada no pilar da legítima defesa torna-se necessária, o que garante, nesse aspecto, a legalidade do ato.
Enquanto isso, a proporcionalidade está associada a uma situação de semelhança em ações, danos e efeitos do ato de defesa em relação ao ataque promovido pelo agressor. Isto é, uma defesa que supere em todos os níveis o ataque sofrido será claramente ilegal por assumir uma natureza retaliatória. Talvez um dos exemplos mais claros seja a utilização de armas nucleares, que levaria a danos excepcionais e seria desproporcional, por exemplo, em reação a um ataque localizado. É importante ressaltar, porém, que o critério da proporcionalidade não consagra um teste estrito de equivalência entre, de um lado, as ações do Estado agressor e, de outro, as ações do Estado agredido. Isso, afinal, levaria a uma situação inadmissível de retaliação. Em conjunto com a necessidade, a proporcionalidade exige que as medidas tomadas em legítima defesa estejam limitadas a determinados fins, como impedir a continuidade do ataque, reverter suas consequências, e dissuadir a realização de ataques subsequentes, ao invés de autorizar uma resposta sempre equivalente ao dano sofrido.
Legítima defesa Coletiva
O texto do artigo 51 da Carta expressamente resguarda não só o direito à legítima defesa individual, mas também aquele à legítima defesa coletiva. Essa modalidade se refere, principalmente, à existência de associações ou alianças militares entre Estados para a promoção de ações de defesa mútua. Nessas espécies de acordos, Estados não diretamente envolvidos em uma situação de ataque armado podem agir em auxílio a um aliado vítima de agressão promovida por terceiro. O exemplo mais evidente de uma aliança dessa natureza é provavelmente a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Conforme esclarece o artigo 52, a Carta da ONU reconhece a legitimidade de tais acordos, assim como de arranjos mais amplos de integração regional (como a Organização dos Estados Americanos, OEA), desde que sejam consistentes com os propósitos e princípios das Nações Unidas. Um aspecto crucial é que, no caso Nicarágua, a CIJ determinou que, mesmo no quadro de acordos de defesa mútua, a legítima defesa coletiva não pode ser exercida sem o requerimento do Estado supostamente atacado (par. 199). Cabe destacar, além disso, que a figura tem relevância atual. Foi o que justificou, por exemplo, o envio à Síria de tropas britânicas e estadunidenses (em suposta defesa do Iraque) e alemãs (em suposta defesa do Iraque, da França e “outros Estados”), além de outros países.
Obrigação de notificar o Conselho de Segurança
Por fim, o artigo 51 da Carta determina que as medidas tomadas em legítima defesa devem ser “imediatamente reportadas” ao Conselho de Segurança. Em razão da seriedade do tema, essa obrigação de notificação tem sido levada a sério pelos Estados. Nesta compilação, foram identificadas 433 comunicações enviadas ao Conselho de Segurança de 1945 a 2018. Isso significa que, hoje, praticamente todo uso unilateral da força é justificado ao Conselho de Segurança como ação em legítima defesa, embora muitas vezes as circunstâncias concretas sejam pouco compatíveis com essa alegação.
Em linha com o modelo de segurança coletiva das Nações Unidas, essa obrigação tem o objetivo de atribuir ao Conselho de Segurança -- e não aos próprios Estados agindo em legítima defesa -- o papel último de análise da legalidade e da legitimidade das ações. Assim, conforme o artigo 51, a legítima defesa é válida somente até que o Conselho de Segurança defina as medidas a serem tomadas para manter a paz e a segurança internacionais. A prática, porém, é repleta de problemas: além de ser pouco transparente quando recebe as notificações, o Conselho de Segurança raramente se manifesta formalmente sobre elas, o que permite que as ações de suposta legítima defesa se prolonguem no tempo. Apesar dessa e de outras dificuldades, é inegável que a regulação da questão pela Carta da ONU representa uma concepção inovadora sobre o uso da força nas relações internacionais, submetendo-o a um conjunto significativo de normas substantivas e procedimentais.
Acompanhe as próximas publicações sobre o tópico uso da força no Observatório Cosmopolita da Corte Internacional de Justiça.